sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Acessibilidades

Depois de anos em que se desvalorizou o papel das vias de comunicação no desenvolvimento da região da Beira – Serra, particularmente nos concelhos de Gouveia, Seia e Oliveira do Hospital, com discussões pontuais à volta do Plano Rodoviário Nacional de 2000, eis que o actual governo apresentou aos autarcas e associações empresariais dos distritos da Guarda, Viseu, Coimbra e Castelo Branco, no início do passado mês de Outubro, três propostas de traçado para as vias que pretende construir. Estas vias visam retirar do isolamento as regiões referidas, permitindo simultaneamente ligar os principais centros urbanos: Viseu, Covilhã, Guarda e Coimbra.
Não que a região acima referida se encontre isolada, mas as vias de comunicação que servem os três concelhos não são compatíveis com as exigências da sociedade actual, em que os factores tempo e acessibilidades são, cada vez mais, elementos a ter em conta quando se trata de sensibilizar empresários a investir em determinada região e aí criar postos de trabalho e riqueza, o que se reflecte em todo o tecido social. A facilidade de acesso aos grandes centros urbanos, com todas as ofertas a eles associados (trabalho, lazer, saúde…), é um elemento decisivo, que condiciona a instalação das pessoas e dos bens de produção. As vias de comunicação que agora se discutem permitirão que as pessoas se desloquem diariamente para trabalhar a muitos quilómetros de distância sem terem que abandonar os locais onde sempre viveram, contribuindo para manter vivas as cada vez menos habitadas aldeias da nossa região. Por outro lado, possibilitarão a chegada mais fácil de pessoas que aqui venham trabalhar / estudar / fazer turismo. Permitirão que se tenha a Saúde “mais próxima”, visto ficarmos ligados a bons centros hospitalares de uma forma muito mais rápida. O empresário terá possibilidade de escoar mais facilmente os seus produtos, sem estar “cercado” de semáforos que abundam nas estradas principais da região.
Das três propostas apresentadas para discussão, uma tem a sua origem no Plano Rodoviário Nacional de 2000 (Chamemos-lhe cenário A). Prevê uma ligação de Coimbra à Covilhã (IC6), passando pela vertente ocidental da Serra do Açor. Do nó de Tábua surgiria o IC7, num traçado algo semelhante à actual estrada nacional 17 (estrada da Beira), entroncando a A25 em Celorico da Beira. Incluiria ainda a construção do IC37, que ligaria Viseu ao IC7 na zona de Santa Comba de Seia.
Outro cenário (B) prevê a ligação de Coimbra a Fornos de Algodres através de um traçado semelhante ao do IC7 do PRN 2000, excepto na sua ligação à A25, que deixaria de se fazer em Celorico da Beira (esta estrada seria o IC6 deste mapa). Viseu seria ligada à Covilhã através de uma via que cruzaria este IC6 na zona norte do concelho de Oliveira do Hospital, e daí sairia a ligação à Covilhã através da vertente sul da Serra da Estrela (seria o IC7 deste mapa).
O terceiro cenário (C) inclui uma ligação de Coimbra a Celorico da Beira através do IC6 (semelhante ao IC7 do cenário PRN 2000 do cenário A), e uma ligação de Viseu à Covilhã atravessando a Serra da Estrela por um túnel que surgiria na zona de Santa Marinha - Paços da Serra e serviria também Manteigas (não é claro se seria um túnel até Manteigas e outro a ligar esta cidade à Covilhã). Seria o IC7 deste mapa.
Confusos com esta terminologia? Quando falamos de IC6, IC7, IC37 falamos de que mapa? Será que é intencional esta mudança de nomes? E ainda não sabemos que perfis terão estes IC’s! Provavelmente não serão auto-estradas, mas ainda não vi isto esclarecido.
Todos os cenários têm vantagens e desvantagens, dependendo sempre da perspectiva do analista. O cenário A seria o ideal para as populações das margens do Alva, mas não corresponde às necessidades dos três concelhos em termos de ligação a Coimbra e à Covilhã. Tem a vantagem para Seia da ligação mais rápida a Viseu ser estabelecida na zona central desta grande região. Não podemos esquecer que a ligação rápida a Viseu significa também ligação a Nelas / Linha da Beira Alta, a todo o Litoral – Norte do país, bem como à A24 e zona da Galiza, na nossa vizinha Espanha.
O cenário B melhoraria as acessibilidades do concelho de Oliveira do Hospital e zona sul do concelho de Seia, mas seria menos favorável para Gouveia e zona norte do concelho de Seia, pois a ligação a Viseu e, por consequência, às zonas Norte e Litoral – Norte, bem como a ligação à Covilhã, estariam longe de ser as ideais. Uma estrada que se quer de fácil circulação, nesta encosta da serra, estará sempre condicionada à execução de muitas obras de engenharia (viadutos, pontes e túneis, ou não será nunca uma via rápida), cujo impacto ambiental será muito importante a ter em conta.
O cenário C parece ser o mais favorável aos três concelhos, vistos como um todo. Seia, por ser o centro de toda esta zona, poderá ser o concelho mais favorecido. Permitiria ligar o Norte e Litoral – Norte ao Interior Centro e Sul, ligar Coimbra à Covilhã e à Guarda / Espanha, com estas vias a cruzarem “frente “ à cidade de Seia, próximo à zona industrial da Abrunheira, com ligações fáceis aos pólos industriais de Oliveira do Hospital e Paranhos da Beira. Dos três, é o cenário que melhor serve Gouveia e Seia, sem comprometer minimamente os interesses de Oliveira do Hospital. Teríamos uma ligação à Cova da Beira muito mais rápida, sem estarmos dependentes das condições climatéricas que por vezes dificultam a circulação na zona da Serra da Estrela. O turista teria facilmente várias portas de acesso à Serra da Estrela, libertando-se o maciço central para aqueles que verdadeiramente o querem apreciar e fruir. Penso que a solução “túneis” seria também a que causaria menor impacto ambiental, atendendo às obras de engenharia necessárias para contornar as Serras do Açor ou da Estrela, o que acontece nos outros cenários. Há quem argumente que esta solução seria impraticável, pelos custos financeiros da obra, e só serviria para adiar a solução do problema. No entanto, quando as propostas foram feitas, o custo da construção do túnel não se pôs; todos os cenários seriam viáveis, mesmo financeiramente.
Os elementos solicitados à empresa que elaborou estes traçados, e que poderiam ajudar a emitir uma opinião mais fundamentada sobre a escolha dos melhores traçados, não foram ainda fornecidos. O prazo dado para as várias entidades regionais se pronunciarem há muito foi ultrapassado.
O Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e Comunicações presidiu entretanto ao lançamento do concurso público para a construção do troço de 22 km do IC6 entre Catraia dos Poços e o nó de Tábua (cujos estudos se iniciaram há vários anos), que dará continuidade ao troço já construído até à Raiva. Referindo que não há ainda estudos para os restantes traçados, mantém a intenção de se tomarem decisões sobre eles já em Janeiro!!!
O Ministro das Obras Públicas Transportes e Comunicações anunciou também uma nova ligação de Celorico da Beira a Trancoso, com perfil de auto-estrada. Enquanto isto, os três concelhos a sul continuam a não falar a uma só voz.
Temo que daqui resulte, uma vez mais, um adiar da tomada de decisões, agora com o argumento de que os que deveriam ser mais beneficiados não se entendem. Penso que, mesmo com decisão, muitos anos de estudos se seguirão antes que surja algo de concreto que possa servir efectivamente este território.
Profeta da desgraça? Como desejo estar enganado!!!
João Alves

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